-um livro para mim e quem quiser ler
1. prelúdio2. pontuações iniciais
3. proposições à minha liberdade
4. discussões adversas
a) os meios são as massagens
b) sobre relações
c) meios para vivenciar minha liberdade
d) espaço público
e) relações intencionais
f) relações de troca
g) anarquismo individualista
h) diferenças econômicas de pessoas
i) idéias de poder
j) opressores e oprimidos
k) clube da luta
5. paisagens
textos por: bruno nobru (2006-2011)
1. prelúdio
desde 2006, estou de tempos em tempos re-lendo e re-escrevendo novamente o que já foi re-lido e re-escrito outras vezes, que começou com o título “à minha anarquia” depois mudou para “à minha liberdade”, mudando de novo nesta revisão para “minha liberdade”, primeiro de janeiro de dois mil e nove, pouso alegre, mg
apesar de parecer pequeno, não é um livro de leitura rápida ou fácil, nem um livro para ler, é para vivenciar, e é denso, sugiro ao leitor ir com calma
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pouso alegre, mg, doze de maio de dois mil e sete, reescrevendo o livreto “à minha liberdade”, que comecei a escrever por volta de julho de 2006, em pocinhos do rio verde, caldas, mg, na casa-truman [1]
algumas idéias vivenciadas e repensadas, outras apenas repensadas, outras mexidas, outras experimentadas, outros autores lidos, processos dialéticos dentro e fora
conceitos de liberdade e anarquia particulares, não são conceitos generalizados
2. pontuações iniciais
a importâncias da práticas cotidianas, de se perceber como está agindo: dominador, submisso ou libertário?
ser carregado ou carregar gente nas costas? seguindo e construindo seu caminho?
o dominador: define o que vai ser feito e o que os outros devem fazer: controla, regula, corrige, afirma, encena autoridade
o submisso: faz o que “acha que deve” ser feito, segue regras, cede a autoridade do dominador, consente, preocupa-se em estar certo para com os outros, seus valores próprios são influenciados pelos outros
o libertário: cada um faz o seu ser liberto, dentro de um espaço de conscientização do entorno e de respeito; a liberdade de cada um é exercida particularmente, sem outros fins (agressivos ou coercivos), de modo que não impeça a liberdade de outrem; conquista uma sociedade libertária sendo livre consigo mesmo e com o(s) outro(s), através da prática
o libertário não se nega, se posiciona diante de uma realidade (condição), mesmo quando parece contrário a si mesmo, pois ele permite sua liberdade de existir e que tem mais valor do que sua própria noção de “si mesmo”, e reconhece a liberdade de outrem, sabendo que a liberdade não é um bem que se tem mas algo que se realiza e se conquista em relação, então quando não se pode fazer algo em conjunto o faz sozinho e quando parece não haver espaço, ele pontua, quando não há caminho, anda sem rumo e cria seu caminho
as primeiras vivências de liberdade estão no sentido de ser libertário consigo mesmo inicialmente; se permitir vivenciar momentos consigo mesmo, olhar para seus desejos, os desejos seus, não de outros, o que faz sentido para si mesmo em sua vida [2]
3. proposições à minha liberdade [3]
permanecer atento à diferença dos meus valores e dos valores dos outros
meus valores são para mim, não para os outros
perceber a diferença entre o que os outros querem que eu faça e o que eu quero fazer
perceber a diferença entre o que eu faço para mim que é para mim e o que eu faço para mim que é para outros, seres ou coisas
as minhas vontades e necessidades estão acima da moral e da ética em questão de prioridade para mim
o que é bom e o que é mau significa: o que é bom para mim e o que é mal para mim, e não o que é bom e o que é mal para os outros
perceber as diferenças entre o que as pessoas são e a imagem que elas querem que eu tenha delas
perceber a diferença entre eu e a imagem que, por vezes, quero que os outros tenham de mim
atentar, constantemente, se o que eu faço e o que eu estou fazendo é para mim
o que eu tenho feito para mim?
não preciso ter pressa para fazer as coisas,
o importante é viver
se deixo minha vida de lado,
ela me deixa de lado também
se não faço para mim, não sou para mim
o que os outros pensam e dizem de mim é deles,
e não meu
para que eu viva para mim, isso implica que eu faça o que eu estou afim de fazer para mim
não tenho de ser adorado por ninguém
a não ser por mim mesmo
respeitar meus limites e posicioná-los aos outros
as pessoas não são o que dizem que são,
mas o que fazem
me livrar de tudo o que eu faço e não gosto
para mim
se não vivo eu, não sou eu
bom é o que faço a meu favor
mau é o que faço contra mim
não tenho de poupar ninguém
a não ser a mim mesmo
pior que se odiar o que estou fazendo
é continuar a fazer o que odeio
se programo minha vida,
deixo de vivê-la para viver o que programei dela
há que eu me dedique à mim mesmo com a maior prioridade e importância
uma coisa é eu, outra são os outros
não tenho compromisso algum para com a pessoa que eu tenho sido com os outros
diferenciar eu de você e você de eu
diferenciar eu do que não é eu
me atentar se o que estou fazendo é para mim, e o que estou fazendo para mim
perceber a diferença entre o que eu quero fazer e o que as pessoas querem que eu faça
não tenho de ser ou agir como os outros
deixar claro aos outros que eles não esperem de mim o que são ou o que querem que eu seja
me faço para a minha expectativa e não para a expectativa dos outros
não tenho compromisso algum com a pessoa que tenho sido para com os outros
meu maior compromisso é com o que eu sinto
não conceder a liberdade para outrem a ponto em que minha liberdade seja ameaçada
se alguém aparecer em minha porta e eu não quiser atender, eu simplesmente não atendo
não tenho de tratar todos por igual, pois são diferentes para mim
[posso ser hipócrita se isso me fizer bem]
[há que eu faça as coisas por elas mesmas, pelo prazer nelas e não por algo além das mesmas]
há que meus sentimentos sejam livres e espontâneos, não frutos de uma reação condicionada ou requisitada por outrem, por uma cultura ou uma lei
se necessário, ser agressivo em favor de mim
há que se sentir quando sentir, por sentir, e não porque se “deve-sentir”
não há como estabelecer leis ou regras prévias ao que vou fazer
me movimento de acordo com meus interesses momentâneos, dentro de um espaço de limites e possibilidades, independente de idéias ou regras estabelecidas previamente por mim ou por outros
não tenho obrigação nenhuma com a vida a não ser vivê-la
mesmo podendo optar por destruí-la
não tenho de me importar com a fala dos decadentes e não tenho de me explicar à ninguém
me libertar de tudo o que faço e não gosto
para mim
exigir meus limites à mim mesmo e aos outros,
minha decisão
não tenho que me importar que os outros tenham uma boa imagem de mim, eles podem achar o que quiser ou, até mesmo, não achar nada, e isso é problema deles, não meu
não gosto de ser injusto ou falso comigo
não tenho de agradar a ninguém mais que a mim mesmo ou quem eu realmente queira agradar
para que eu seja eu, isso implica em que eu faça o que quero fazer para mim
tudo o que eu faço por mim, faço à única pessoa que sempre tive e sempre terei em minha vida
minha força à meu favor é representada pelo ato de ir contra as leis dos outros e seguir a minha própria vontade e necessidade
a fala da pessoa que se direciona à mim não se refere à mim, mas, inicialmente, à mesma que diz
tudo o que há é eu e está em mim: o que penso e sinto sobre as coisas que não são eu; o entorno e os outros se internalizam em mim e vão construindo um “eu-tudo”
a pessoa que é mais companheira é eu mesmo, pois está comigo todo o tempo, seja onde eu estiver
posso utilizar minha autoridade e posso ser odiado, principalmente ao resistir às tentativas de uso de poder dos outros sobre mim
[ser desobediente, mau e subversivo, ser o que a sociedade burguesa (correta e obediente) não quer; não ser justo nem verdadeiro, não fazer bem aos outros – posso ser isso ou o contrário, tanto faz]
os fracos me rotulam pelo que eles próprios são e fingem não ser; projetam os valores deles em mim
eles querem que eu seja como eles, enquanto eu quero ser eu, essa é a grande diferença e a luta constante e particular do dia-a-dia
nenhum fato é o mesmo que outro
não acreditar, de cara, em nenhum pensamento que não seja conseqüente de um movimento meu
fazer o que me possibilite eu ir além dessas regras pitorescas, que eu seja para mim
não tenho de esperar que os outros respeitem a minha vontade, eu que tenho de fazer ela valer, independente do que os outros queiram ou pensem
se sou diferente, há que eu lide com os outros de maneira diferente também
eu faço e aplico à mim mesmo minha própria lei, e a altero quando quero ou posso
há fortes e fracos, aproveitadores e aproveitados, opressores e oprimidos, sujeitos e assujeitados
buscar meios para me descomprometer em fazer alguma coisa, se caso não quiser mais fazê-la
meu maior compromisso é comigo mesmo, com mais ninguém
reivindicar a mim mesmo o tempo todo, a minha liberdade de existência, o meu sentimento, a minha decisão, a minha subjetividade
por vezes, prefiro não fazer sempre o que acredito que devo fazer, para não gerar dívida comigo mesmo por não viver o que quero
é preciso coragem e teimosia, para me assumir a mim mesmo como causa.
minhas vontades e necessidades estão acima da moral, da ética e da lei em nível de prioridade para mim, mesmo que eu não as cumpra
meus movimentos estão tão livres para existirem dentro de um espaço com limites, tanto quanto a liberdade de criar outros meios para agir e encontrar outros espaços e maneiras de existir
4. discussões adversas
a) os meios fazem massagens
permanecer atento aos detalhes de certos comportamentos dos quais somos impelidos através de movimentos sutis, silenciosos e disfarçados. atentar também aos comportamentos que nos sugerem à fazer ou que nos reforçam ao fazermos
é a guerra-silenciosa, as massagens mentais, a ditadura ideológica, o jogo que acontece e se propaga dia-a-dia. no contato com o externo que repercute na solidão interna
b) sobre relações
jogos em relações – pessoas que se movem por interesses próprios
há que as relações entre as pessoas sejam livres, onde ninguém exerce poder sobre ninguém, ambas as partes possuem a liberdade de escolher e as regras e limites são estabelecidos na relação em processo, através do respeito de um por outro
as relações se mantêm por interesses mútuos e quando estes não mais conferem para ambos, simplesmente fazem cada qual sozinhos
cada interesse particular é de maior importância para a pessoa que o sente do que para as outras – neste caso, o que vale é a liberdade de escolha
todos somos diferentes, o que mantêm nossa relação são os interesses aproximados. portanto o que não mantêm a relação são interesses distantes
cada qual está constantemente em busca de seus interesses particulares
c) meios para que eu vivencie a minha liberdade
para que eu vivencie a minha liberdade, há que eu me permita experimentar momentos comigo mesmo. para isso, não basta que eu esteja sozinho, mas tenho de estar na minha companhia: me percebendo, conversando comigo e me sentindo
no que escrevo, escrever para mim, de acordo com minhas preferências, meu gosto, minhas vontades, ideais e parâmetros
ao lidar com os outros, requerer minha liberdade de crença, de pensamento, de vontade própria, de movimentar-me como e quando quiser; de consentir ou não, e até, de estar disposto a conversar ou não
não tenho de conversar com qualquer pessoa à qualquer instante. quando uma pessoa aparece com assuntos esperando que eu continue a conversa, trata-se de um desejo desta de querer a minha atenção por um lapso de tempo, mas nem sempre é meu o desejo manter-me atento, portanto não tenho necessariamente de continuar o assunto, por mim, ou posso deixá-lo para outro momento
se qualquer um tem o direito de frustrar minha vontade de permanecer em silêncio introduzindo sua conversa, eu também tenho o direito de frustrar sua vontade de conversar
o que muitas das pessoas pretendem são apenas características minhas das quais elas possam realizar seus desejos, pois nos movimentamos por desejos e buscamos meios para potencializá-los, buscando assim no outro, muitas vezes, certas características para realizar vontades próprias
se, em algum momento, não se quiser dar atenção a uma pessoa, não se dá. o que importa não é realizar o desejo do outro, mas sim expressar o que se sente realmente; todos possuem desejos e cada qual está para realizar os seus
quando não se quer dizer nada o mais sensato a fazer é não dizer
para viver minha liberdade, há que eu me permita a viver minhas diferenças e não viver pela liberdade, mas por mim
d) espaço publico
o espaço público é muito diferente do particular, ele oprime o privado, com coisas que não se pode apreciar, outras que não pode ter, outras que desagradam, ... é no espaço publico que ocorrem estupros múltiplos aos valores, maneiras de ser, agir, sentir e pensar
no espaço publico todos são violados, o tempo todo, tal como as leis federais que afetam todos os indivíduos que se corresponderam a cidadãos de uma nação, e, mesmo os que não se sentem como tais também são afetados. todos os meios de comunicação, arquitetura e espaço físico também afetam. diferentes meios se agregam no indivíduo gerando uma violação da existência autêntica
uma pessoa em um local publico, seja como for que ela esteja vestida, o que ela fizer ou deixar de fazer, estará envolvendo sua imagem, seus valores e seu jeito de ser para com os outros deste local
o simples fato de andar num ambiente público já afeta as pessoas que nele estão, o fato de ser visto por outras pessoas já agrega um tipo de relação com as mesmas, onde as que observam já interpretam, rotulam, associam, desejam, odeiam, assemelham, diferem, etc
pelas múltiplas possibilidades de sentimentos e os moralismos da qual herdamos historicamente de nossa sociedade, no espaço publico os desejos são enrustidos: ódio, amor, raiva, dó, medo, desejo sexual, paixão, dor, etc. apesar de senti-los, boa parte deles são reprimidos pela convenções sociais vigentes; o que faz com que, muitas vezes, sejam manifestados de outras formas, seja por expressões corporais inconscientes ou projetados em outros momentos e circunstâncias, mas com a intensidade gerada anteriormente
o espaço publico é um espaço hipócrita por suas leis que privam que se expresse o que cada um sente, falsificando as relações
todos os fracos, ou em condição de fracos, se calam e se falsificam pois é “preciso” assumir seu papel no espaço publico. o que contradiz esses papéis é tido como ameaça, mau, errado, ... que, se persistir, aos poucos é ejetado das possibilidades de convivência nos espaços, até mesmo que por sobrevivência
e) relações intencionais
muitas pessoas, o tempo todo, vivem recheadas de intenções sobre outras pessoas, sendo este o intuito do que fazem quando se relacionam
são as intenções do que elas querem dos outros para elas, são realizações de desejos particulares através do uso dos outros
é preciso que se perceba isso para lidar com o proveito dos outros e do uso deles sobre nós; para não consentir, e sim mostrar aos outros que se percebe isto e ir contra o movimento deles. já que é uma batalha, e os outros estão jogando, há que sejamos jogadores e vencermos
dizer não aos opressores e opressoras, e dizer sim à si mesmo
f) relações de troca
não é por uma pessoa fazer algo para mim que me agrade que eu deva agrada-la também
agradar é muito relativo, pois um agrada o outro através do que é agradável em seus parâmetros do que é agradável, o que não necessariamente se adequa aos parâmetros de agradável do outro
se caso eu queira agradar outra pessoa, que não seja por uma troca, porque ela me agradou ou para que eu tenha um agrado da mesma posteriormente. há que agrade quando sentir vontade desinteressada em agradar, com o único intuito de se agradar e nenhuma troca além desta.
g) anarquismo individualista
a palavra ‘anarquia’ e ‘anarquismo’ são interpretadas de diversas maneiras, muitos são os ‘anarquistas-socialistas’, que pregam a liberdade própria em conjunto com a liberdade alheia, os que possuem um âmbito social em sua noção de liberdade. no meu caso, utilizo a anarquia com o intuito de libertação particular, à minha anarquia, onde o principal alvo do exercício da liberdade é eu mesmo
não aceito compreender a palavra 'anarquia' como um conceito já posto, já pronto, uma classe; o que vai em sentido totalmente contrário de minha liberdade própria
h) diferencias econômicas de pessoas
as pessoas são diferentes por subjetividade, por criação, por cultura, e muito também por condição econômica. há muitas diferenças nos modos de ser perante as diferentes classes econômicas e estas não se relacionam, como que se fossem castas ocultas em classes de mobilidade
cada pessoa vivencia ambientes que sua classe econõmica a permite ou oferece, esses ambientes são limitados a essas pessoas e geram valores próprios, regras próprias e proibições da entrada de pessoas de outras economias
não são ambientes particulares, mas também não são por total públicos estes que vivenciamos pois alguns possuem acesso, outros não e outros não se interessam por participarem de grupos e ambientes com valores diferentes
i) idéias de poder
desconstruir a idéia dos outros de que eles possuem algum poder sobre a minha pessoa
não fazer algo porque a pessoa pediu ou porque a pessoa quer, e sim porque eu quero, ou porque houve o meu consentimento
não aceitar qualquer forma de opressão ou de exercício do poder externo quando somente para o favorecimento do externo
j) opressores e oprimidos
a alienação ao trabalho, as drogas, a vícios, a televisão, a escola, a sua própria moradia, a todos, a tudo, ... tornar-se alheio a si, ao outro; um ser moldado por outros, alienado ao teatro, a loja da esquina, ao filme do cinema, ...
os mecanismos sociais que constituem o indivíduo: família, escola, igrejas, televisão, amigos, lojas, rádios, jornais, filmes, novelas, shows, teatros, lugares, ... seguem a modelos padronizados de seres humanos, com bases de conduta seriais, constituindo, geralmente, duas qualidades no ser humano:
uma. ser submisso, obediente, pacato, que serve aos outros e as regras de outros, acata a autoridade, é “bonzinho”, age de maneira correta de acordo com os parâmetros sociais, segue ordens, se cala, sente culpa e errado quando foge dos padrões
duas. ser induzido ao consumo, alienado ao capital, numa busca constante por ter – o que não consegue ser – e, assim estabelece neuroses de consumo, em relações de submissão e dependência para com os produtos, seguindo carregado por valores de mercado, buscando mais a etiqueta do que a si mesmo
a maioria das empresas favorecem isso porque querem isso, o que o mercado quer é um povo medroso e facilmente domesticável, para guiá-los no que for útil ou necessário para eles.. eles querem realizar suas vontades através do lucro que é obtido pela venda
o neoliberal, capitalista-privado, quer saber única e exclusivamente de seus lucros, não quer saber dos outros, nem família, nem amigos, nem de ninguém, e nem sabe muito de si mesmo, quer saber é de seu dinheiro, em ter dinheiro para satisfazer suas neuroses de consumo, se alienando como fracos servindo-se aos outros que como eles são
alguns que se julgam melhores, que compram “cultura”, livro de autor famoso pra se gabar de repetir as frases e o nome no alemão para os parentes, amigos, compram discurso pra seduzir a namorada e compra o pó pra cheirar se não der certo, e vão direto pra zona, comprar sexo, que nem isso eles conseguem sem que tenham de comprar
são fracos que compram o que não conseguem ser
j) clube da luta
um sujeito que trabalha para uma empresa de automóveis e leva uma vida que se resume em trabalhar, consumir, dormir, viajar a trabalho, consumir, dormir, trabalhar, repetidamente. ele se encontra numa situação problema ao ter insônia, e vai começando a perceber que sua vida não passa de uma cópia, de uma cópia, de uma cópia...
o médico diz que se ele quer ver sofrimento, que visite grupos de apoio para portadores de câncer de testículo. ele começa a visitar reuniões de grupos e passa a se sentir bem. aos poucos ele busca por outros grupos e vai se tornando um viciado em grupos de apoio. a mentira de marla reflete sua mentira e ele perde noites de sono
após uma viagem de trabalho, ele se depara com seu apartamento em chamas, explodindo inesperadamente, como não há para onde ir, tyler durden passa a hospedá-lo em sua residência, um casarão abandonado sujo e com goteiras. o clube da luta, é formado com a proposta de que se encare a vida como algo a ser experimentado, para que ela tenha sentido. as vivências vão se entrelaçando, o que potencializa um jogo esquizofrênico entre eles.
em meio as lutas, tyler diz seus ideais que quebram com a maneira pela a qual encaramos a vida cotidianamente
o que fazemos de nossas vidas? geralmente trabalhamos para produzir o que não consumimos, muitas vezes, consumimos o que não é necessário, guardando um estoque de coisas que não utilizamos e não utilizaremos nunca. “a propaganda nos faz correr atrás de coisas e a trabalhar em empregos que odiamos para comprar porcarias de que não precisamos"
"você não é seu emprego ou o dinheiro que possui", "as coisas que você possui acabam te possuindo", tudo o que é preciso para esse sistema funcionar são de pessoas para produzir de um lado, e pessoas para consumir, de outro. somos nós os que produzem e consomem, servimos assim de baterias condutoras desses processos. "essa é a sua vida e está acabando a cada minuto".
vamos morrer um dia e a nossa vida terá sido sempre a mesma se não mudar a maneira de encarar as relações, e, quando morrermos não teremos mais nada.
“fomos criados pela televisão para acreditar que um dia seríamos ricos, estrelas de cinema e do rock, mas não seremos, e estamos aos poucos aprendendo isso" [4]
5. paisagens
e como eu queria escrever, o ato fez-se e aqui estou, não só eu mas outros também, inclusive os que não estão. ontem estava pensando, sacando e sentindo entre outras coisas, o que denominei para mim mesmo como 'paisagens', que se estabelecem numa percepção de imagens, sons, idéias, sentimentos, momentos, cores, odores, etc. sendo a relação destas um momento único, momento este do qual se vivencia diversas vezes, todos os dias. alguns com mais intensidade e outros menos. tratam-se de configurações complexas que não se nomeiam nem se categorizam por completo, também não há o que se julgar ou discriminar. nelas contêm o que há e o que não há, para o além do que se escuta, sente, vê, cheira, escreve, ...
cada paisagem configura-se num todo pseudo-particionado, completo e faltoso, subjetivo e inconsciente, orgânico e concreto. são meros símbolos as palavras que tento utilizar para descrevê-lo, imperfeitos ideais de coisa, o que não é se [se aproximar] nem se [distanciar], mas tal-vez associar. descrever qualquer paisagem é um ato ingênuo, pois esta se vivencia, é uma experiência, não um conceito. os comentários são com intenção de intensificar vivências, não para se guardar conceitos e ficar parado como um sábio-tolo.
na arte, as paisagens podem ser associadas a performances, onde se entrelaçam ações pré-concebidas e improvisadas; mixando poesias, músicas, danças, teatros, pressupostos conceituais, ... tornando uma arte de paisagens, com cenas complexas, multifatores, rizomas e reações.
um de meus eus percebe o quanto tenho eus que são meus e eus que não são meus, quem sabe um equilíbrio fosse uma saída, porém não sei mais o quanto me vale essas saídas ideais, antes fossem saídas práticas, simples, bobas.
disto que se lê, o primordial é que se aplique na vida. e não é somente o que se vivencia, é isto inicialmente, para depois ser mais e mais forte e tornar-se outro.
de costume, não gosto de escrever muito. os que escrevem muito parecem, muitas vezes querer dizer verdades, e não é isso o que pretendo, mas sim escrever para mim, sobre relações e vivências, relações sobre idéias de relações, relações entre idéias de verdade, mutações entre experiências práticas. quando se escreve muito, se delimita idéias e vivências, cortes, tempos e vidas; ou se distancia por demais do que se pretende? parece ser como enxerga. o poder é subvertido quando não se exerce ou quando não se permite que seja exercido e nada mais para esse trecho. a estética que se costuma utilizar na escrita e no livro não é, pois, o que se parece com as revoluções tecnológicas e vivencias atuais. como muito mudou e muito permaneceu, o que permaneceu se mantêm distante. o pragmatismo da linguagem mantêm paradigmas que já não se correspondem com as vivências, que se realizam em paisagens e em movimentos, que não se decodificam da mesma maneira que a repetida.
regras sociais, valores, linguagens, amores e dores se estabilizam em pequenos grupos sociais: normas de seitas religiosas, de escolas, famílias, empresas, grupos de amigos. porém na sociedade elas se multiplicam, se interferem, se chocam, se alteram, se decompõem, se transmutam e, de repente, já não são quase nada do que antes eram.
não me vem ao caso que o outro pense ou diga que estou louco para com o que escrevo, é minha particularidade enquanto pessoa, minha diferença que está em questão, não um ‘conceito’ a ser defendido. muitas vezes quando se diz algo à alguém a crítica se mantêm pois o outro é visto como ‘doutor de verdades’, como se esta fosse a função dos livros e da linguagem: enunciar verdades. alguns ‘não concordam com o que escreveu o autor de tal livro’, ou ‘não concordam com o que diz o colega’. o autor escreve para ele, o outro fala para si mesmo, eu para mim e você para você; cada um sua visão de mundo diferente, cada um sua paisagem, sua brisa.
perna cheia de picadas de insetos, pés sujos, acabei de lavá-los no tanque. o escritor não é o que pára em frente à folha, faz sua reflexão e escreve sua ‘idéia’ em palavras, mas escreve no intervalo do tempo, na fila do banco, na viagem de ônibus; é sujeito de outras vivências e escreve por outras circunstâncias. não há anunciador de nada, o importante para mim agora é que quero tomar um pouco de café.
algo meu não se trata de uma verdade, mas de uma construção momentânea, uma brisa. não agir por pressuposto talvez seja uma das condições para a liberdade, para um caminho outro... não responder é, muitas vezes, mais libertário do que dizer algo... o simples fato de se cumprimentar alguém já exclui uma espécie de liberdade. uma linguagem diferente pressupõe e propõe uma vivência diferente, única e liberta de outros pressupostos anacrônicos, ideais e 'a prioris'.
a construção que se busca com isso é a construção do nada, que deriva de uma paisagem [outra] experimentada. a escrita propõe um segmento, as vivências des-segmentam-se os segmentados. a voz do silêncio e as meditações do budismo tibetano proporcionam a escuta do que não há. com uma tesoura pode-se cortar palavras que se interessa de um texto e personaliza-lo, desmonta-lo e remonta-lo da maneira que preferir. enquanto alguns eus ficam de fora, os que se mostram aparentam ser o todo.
a descrição das paisagens, não termina, pois sai do texto para além, da imagem e da sensação momentânea, voa nas potencialidades que cada um socar. onde há planta, há planta, onde não há, há planta em potencial. a paisagem está aí, a diferença brota do nada, e o que importa agora é brotar.
escritos: bruno nobru.
contato: trocarletras@gmail.com.
[1] casa estranha onde fiquei por alguns meses, rodeada por ciprestes, onde a noite, qualquer um que ao seu redor pode ver tudo por dentro, e onde coisas estranhas aconteceram.
[2] “um homem bem logrado (...) está sempre em sua companhia, quer esteja com livros, homens ou paisagens” (ecce homo, nietzsche, 1888).
[3] para lembrar-me de coisas que por vezes esqueço.
[4] referências entre aspas do livro “clube da luta”, de chuck palahniuk.
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